A indignação está na moda
Hoje foi um grupo de estudantes, acompanhado de um deputado do Bloco de Esquerda, que ocupou a cantina da Universidade de Lisboa na Avenida das Forças Armadas, em protesto contra o anunciado encerramento das instalações. É o regresso ao Fascismo e à Educação reservada para os ricos? Não. Parece que «oito em cada dez alunos que usufruem de uma das cantinas da Universidade de Lisboa (UL) pertencem à instituição vizinha, ao Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE)», do Instituto Universitário de Lisboa (IUL). Nem está em causa a incompreensível existência de quatro (4!) universidades públicas em Lisboa, cada uma com os seus próprios Serviços de Acção Social (SAS). Acontece que os SAS da Universidade de Lisboa estiveram anos a fio, e até agora, a subsidiar um serviço utilizado por estudantes de outra escola. Parece fazer todo o sentido que a cantina seja encerrada, de forma a que os recursos sejam direccionados de forma mais eficiente para os alunos da instituição. Parece? Pelos vistos, há quem não compreenda. Ou não queira compreender.
Ms. Lizzy
«Hurricane», MS MR.
Entrou formosa e não segura, com o Castelo de São Jorge como pano de fundo. De semblante fechado, enrolada num espesso casaco, não perdeu tempo com grandes palavras de circunstância. Mas as luzes, as sombras e o fumo adequavam-se bem à música do grupo de Brooklyn, e Lizzy foi ganhando confiança. Além disso, o público de Lisboa sabia bem o que esperar dos MS MR. À medida que a actuação avançava, Lizzy despiu o casaco, mostrou uns sorrisos, desprendeu-se, arriscou algumas palavras de agradecimento. Ao fim da noite, depois de «Hurricane», a vocalista parecia outra. Dona do palco, com um sorriso de orelha a orelha, confessava não ter o hábito de fazer encores. Por vezes são as bandas que se rendem ao público e não o contrário.
Um ano de amarelo
Bradley Wiggins não tem a liderança natural de Armstrong, o carisma de Pantani ou a fúria tranquila de Contador. Não é um grande trepador nem pedala de forma particularmente espectacular. Alguns dizem que é snob, outros acusam-no de ser uma fria máquina de pedalar, formado na monotonia do ciclismo de pista. Ainda assim, Wiggins já garantiu o seu lugar na história do ciclismo de estrada, não só por se ter tornado o primeiro britânico a ganhar um Tour de France, mas principalmente pelo feito único de conquistar, no mesmo ano, o Ouro olímpico (em contra-relógio) e a Volta a França.
De facto, Wiggins é um autêntico anti-herói. Ao longo do último Tour, muitos foram os que puseram em causa a sua capacidade de vencer a prova. O maior desafio surgiu do companheiro que era suposto protegê-lo dos mais directos ataques adversários, Christopher Froome, e que por diversas vezes pareceu estar mais preparado para os rigores das subidas do que o próprio chefe de fila. A certa altura, embalado pelas especulações da imprensa, Froome pareceu contrariar as indicações da direcção da equipa e ensaiou um ataque ao líder, para logo a seguir recuar. Sem convencer, Wiggins acabou por vencer e chegar de amarelo a Paris.
O documentário Bradley Wiggins A Year In Yellow, acompanha o ciclista britânico ao longo de 2012, onde para além do Tour e dos Jogos Olímpicos, venceu ainda provas emblemáticas como o Paris-Nice e o Critérium du Dauphiné (sem esquecer o terceiro lugar na Volta ao Algarve, que não é mencionado no vídeo). Como é cliché neste tipo de trabalhos, o documentário mostra o outro lado do campeão, revelando um Wiggins humilde e tímido, longe do luxo e da exuberância de tantos outros, mas obstinado com o ciclismo. Homem de família, mas ainda atormentado pelo abandono do pai quando era criança. Um pai que mal conheceu e que morreu em circunstâncias estranhas, acompanhado de um caderno com recortes dos êxitos do filho. Um documentário com imagens magníficas, para todos os que gostam de ciclismo e não só.
As palavras dos outros (IV)
"Ficamos sozinhos quando somos exigentes. Ficamos sozinhos quando não mentimos. Ficamos sozinhos quando defendemos as nossas convicções. É um preço que estou disposto a pagar."
Pedro Mexia
in Expresso, 1 de Dezembro de 2012.
Assim se vê a força do PC
Por ocasião do Congresso do PCP, a edição impressa do Expresso registou o regresso do partido a certos chavões «que nos últimos anos haviam tido menos uso — como a "luta de massas" ou a "socialização dos principais meios de produção e circulação"». Só quem anda distraído pode ficar surpreendido por este back to basics do PCP, como lhe chama o semanário. Desde 2009 que o partido tem vindo a reabilitar, timidamente, a sua iconografia tradicional, juntamente com certas imagens e slogans. Perante a grave situação de crise e incerteza que o país atravessa, o PCP vai ajustando o seu posicionamento, na expectativa de uma redefinição do jogo eleitoral, que tanto baralhou as contas na Grécia. Afinal, o PCP é a força política mais estruturada, organizada e disciplinada neste país. Henrique Raposo, na sua coluna do Expresso da semana passada, afirmava que o PCP ficou preso na «cultura sectária de Álvaro Cunhal», em oposição à «atitude democrática dos eurocomunistas» do PCI/PCF/PCE. É que para o PCP, a Democracia, tal como é concebida no Ocidente, nunca foi uma convicção, mas uma imposição. Esquece-se Henrique Raposo que, apesar de tudo, a estratégia do PCP resultou. Enquanto a abertura do PCI/PCF/PCE teve como resultado a extinção ou a irrelevância, em Portugal os comunistas continuam aí para as curvas, com uma bancada consolidada no Parlamento, o domínio do aparelho sindical, um considerável território autárquico e uma Festa que já entrou no calendário dos Festivais de Verão. Sobreviveu à queda do Muro de Berlim e parece contrariar os que apontavam o Partido como uma excentricidade lusitana e um anacronismo condenado a uma lenta mas irreversível dissolução. Como se viu este fim-de-semana em Almada, o PCP está de boa saúde. E a sua mensagem vai endurecendo.
Força Delta
«Taro», Alt-J.
Em comparação com tempos recentes, 2012 tem sido um ano extraordinariamente pobre em música nova. De um modo geral, as coisas novas que vão surgindo reflectem influências demasiado vincadas, num exercício de replicação e reciclagem muito pouco estimulante. Ainda assim, uma das boas surpresas deste ano são os Alt-J, uma banda com um terrível nome mas uma sonoridade intrigante que desafia a catalogação. É verdade que às primeiras audições tudo parece demasiado estranho e deslocado, mas à medida que se ouve An Awesome Wave, as peças vão encaixando para revelar uma magnífica engrenagem. Não é à toa que a banda levou para casa o Mercury Prize deste ano para o melhor disco do Reino Unido. Entretanto, para os interessados, os Alt-J estarão por Lisboa na próxima sexta-feira, para mais uma edição do Vodafone Mexefest.
Revolução Cultural
Após encerrar as suas três lojas na Grécia, a FNAC prepara-se para abandonar Itália. No entanto, segundo a filial portuguesa, "a notícia do encerramento da FNAC italiana não terá qualquer implicação na estrutura e no plano de expansão da FNAC em Portugal". Podemos dormir descansados. Afinal, ao nível de vendas, Portugal representa o terceiro mercado do grupo, à frente de países como a Bélgica e a Suíça. Uma verdade inconveniente é que a FNAC fez mais pela cultura no nosso país do que muitos subsídios ao teatro, às artes e às «performances». Muitos queixam-se da forma agressiva como esta rede entrou em Portugal, com uma política de esmagamento de preços que exterminou quase toda a concorrência, ao ponto de actualmente em Lisboa subsistir apenas uma mão cheia de pequenas lojas dedicadas à venda de música. Ainda assim, a FNAC veio revolucionar o acesso aos bens culturais, com uma rede descentralizada de lojas a disponibilizar uma grande variedade de literatura, música e cinema, a preços razoavelmente competitivos. Hoje, um adolescente de Viseu pode adquirir facilmente «O Coração das Trevas» de Conrad, por 9,90 euros. Haverá melhor exemplo do que este?
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